Associados à fotografia, desde sempre, existiram inúmeros conceitos e princípios ópticos e geométricos que, sendo muitas vezes por si só de difícil entendimento virtual são, contudo, de fácil demonstração. O artigo que hoje publico versa, precisamente, sobre um deles… No fundo, as explicações e demonstrações que ao diante verão fazem parte duma promessa de desmistificação (a alguns leitores) de algo que, à partida, parecendo claro e óbvio não deixa, no entanto, de iludir a maior parte dos fotógrafos.
Trata-se do conceito e aplicação prática da profundidade de campo relacionada com o uso de objectivas de diferentes distâncias focais.
Ou melhor:
A profundidade de campo altera-se com o uso de diferentes objectivas ?
Como todos saberão (ou, pelo menos, grande parte dos leitores), a profundidade de campo, em fotografia, designa o espaço considerado nítido antes e depois da zona em que foi seleccionado o foco. Além disso, é também sabido que a profundidade de campo obtida está directamente relacionada com a abertura do diafragma que usamos. Quanto maior essa abertura (valores f/stop pequenos - ex. f/1.8; f/2.8) menor será essa profundidade de campo e vice-versa. Para um melhor esclarecimento acerca desta questão clique aqui. (abre em novo link)
Ter a noção destes conceitos é de extrema importância na fotografia. É através da selecção duma maior ou menor profundidade de campo que damos relevo a um todo ou, pelo contrário, a uma só parte da fotografia desfocando os elementos que não nos interessam. Por exemplo, no caso de retrato em que se pretende destacar o rosto do fundo usamos uma abertura de f/2.8. Pelo contrário, usando aberturas pequenas (f/22), como no caso da fotografia de paisagem, obtemos uma grande profundidade de campo e uma imagem nítida desde o primeiro plano até ao infinito.
Bom, até aqui decerto que não haverá muitas dúvidas… Agora vamos ao motivo que me levou a escrever este artigo…
Tenho-me apercebido que, pese embora os conceitos acima expostos sejam de fácil entendimento e percepção, reside na maior parte das pessoas a ideia (errada) que a profundidade de campo varia em função da objectiva que utilizamos. Ou seja, existe a ideia generalizada que as teleobjectivas proporcionam, com a mesma abertura de diafragma, maiores desfoques em virtude duma menor profundidade de campo. Só parte disso corresponde à verdade! Na realidade, esses melhores desfoques ou “bokeh’s” não se devem a uma menor profundidade de campo mas sim antes à distância a que nos encontramos do objecto e à proporção deste em relação ao fundo! Vamos, então, tentar perceber o porquê de tal facto...
As teleobjectivas tendem a “aproximar” os elementos mais distantes comparativamente às objectivas de distância focal mais pequena. Motivo porque se cria essa ilusão! Acerca deste aspecto reparem, também, nas fotografias e grafismos mais abaixo e atentem nas diferenças do desfoque do fundo conseguidas quando usadas diferentes distâncias focais. Foi alterado, neste caso, a distância entre o plano focal (conta-se a partir do sensor da câmara) e o objecto focado de cerca de 4 para 12 metros, respectivamente, mantendo-se a porpoção do motivo! *
Estas noções são, por vezes, um pouco difíceis de explicar… e de entender. Por isso, nada melhor que recorrer a exemplos!
Começando pela analise às fotografia do topo (sem qualquer alteração em termos de redimensionamento) facilmente verificamos que usando a mesma abertura (no caso f/5.6) a profundidade de campo manteve-se inalterada quer a 87mm, quer a 600mm de distância focal. Se repararem, a área escolhida para a focagem foi a parte mais próxima da segunda tangerina. *
* Primeira conclusão: Desde que captadas na mesma proporção e com a mesma abertura de diafragma, independentemente da distância focal usada, a DOF (Depth of field – termo Inglês para designar a profundidade de campo) mantém-se inalterada!
* Segunda conclusão: A proporção dos elementos altera-se em função da objectiva usada! O que mudou? Conseguem notar alguma diferença? Vejam e comparem o tamanho do limão e da tangerina que se encontra em primeiro plano! Enquanto que o tamanho da 2ª tangerina (onde incidiu o foco) se mantém idêntico nas duas imagens, pelo contrário, a 1ª tangerina é proporcionalmente maior na primeira foto que na segunda acontecendo, precisamente, o contrário com o limão que se encontra em último plano! Este equilíbrio das proporções conseguido através do uso de teleobjectivas (2ª foto) é um dos motivos que fazem com que não tenham somente aplicação em fotografia de natureza….
Já que estamos com a ”mão na massa” e a falar de diferenças entre as imagens captadas através de teleobjectivas e objectivas de distância focal "normal" ou até de grande angulares, ao lado fica um gráfico que esclarece uma outra diferença… a repartição da profundidade de campo. Esta sim é uma das diferenças que existem! Também é uma matéria a ter em consideração pois pode ajudar-nos a calcular melhor a zona onde deverá incidir a focagem. Superficialmente, vou só dizer que uma objectiva de 50mm terá uma repartição da profundidade de campo (zona nítida mais próxima/mais distante) de cerca de 46%-54%; uma 600mm terá aproximadamente 50%-50% e uma Grande-angular de 10mm terá sensivelmente 30%-70%. Mas, quanto a isto, nada melhor que observar o gráfico ao lado que deverá ser mais que suficiente para esclarecer. Alerto, contudo, para o facto da relação de proporções lá indicada (no caso das Grandes-angulares) estar um pouco exagerada para melhor visualização das diferenças e do que quero dizer….
Continuando a falar de exageros, aproveito para dizer que caso queiramos ser verdadeiramente rigorosos (mais tipo científicos...) apesar de acima ter dito que a profundidade de campo se mantém inalterada independentemente da distância focal refiro-me em termos genéricos e perceptíveis pois, na realidade, existem ínfimas alterações dessa profundidade de campo as quais não devem ser tidas sequer em consideração uma vez que são praticamente imensuráveis!
Continuando a falar de exageros, aproveito para dizer que caso queiramos ser verdadeiramente rigorosos (mais tipo científicos...) apesar de acima ter dito que a profundidade de campo se mantém inalterada independentemente da distância focal refiro-me em termos genéricos e perceptíveis pois, na realidade, existem ínfimas alterações dessa profundidade de campo as quais não devem ser tidas sequer em consideração uma vez que são praticamente imensuráveis!
Por ultimo, observem as fotografias acima. Estas servem de demonstração acerca da forma como as teleobjectivas “ampliam”, ou melhor, aproximam os objectos mais distantes. Neste caso, o fundo. Uma vez que este está desfocado, quer numa, quer noutra fotografia, será "a tal área" chamada de “bokeh” ou desfoque. No entanto, apesar desse desfoque parecer mais intenso e agradável na foto captada a 600mm isso deve-se unicamente à maior proximidade que aparenta ter o fundo devido a um menor ângulo de imagem. Para tentar transmitir essa noção, reparem na primeira fotografia (@ 120mm) onde pode observar-se, seleccionada a verde, a única parte da área que passa a ser visível na foto a 600mm. A profundidade de campo não se alterou! Por outro lado, rapidamente se chega à conclusão que quanto maior for a distância focal usada, para obtermos a mesma porção do assunto fotografado, mais teremos de nos afastar do mesmo. Dessa forma, conforme podem confirmar no grafismo o ângulo de imagem será também menor pelo que a diferença de tamanho ficará reduzida criando-se, deste modo, a ilusão de um maior nível de desfoque com a mesma abertura…. Talvez seja melhor mesmo observar as figuras e tentar perceber...
Bom, assim ficamos com mais um artigo... Espero que tenha ajudado a dissipar algumas dúvidas...
6 comentários:
Então não serviu...
Sempre me fez alguma confusão a relação entre distâncias focais e profundidade de campo.
Até já o tinha questionado directamente a esse propósito numa ou duas ocasiões a propósito das suas excelentes fotografias "aviárias".
Confesso que nunca tinha dado grande atenção ao assunto até porque nunca usei tele-objectivas.
Mas finalmente percebi a correlação.
E, parecendo complicado, até é simples.
Se calhar por causa da explicação :-)
Efectivamente, o Pedro foi uma das pessoas de quem me lembrei e que, pelas pertinentes dúvidas, era merecedor da explicação… fico contente que tenha sido útil.
Abraço
Obrigado, José.
José, sou iniciante na fotografia e confesso que esse é o primeiro tutorial que me fez entender essa relação entre a distância foca e profundidade de campo.
Já revirei quase o site todo e o conteúdo é muito bom, principalmente para os novatos.
O que me mata um pouco é que tenho uma Nikon D40 com a objetiva original do kit, uma 18-55mm GII ED. Aqui no Brasil as objetivas melhores ainda tem preço muito elevado para quem utiliza a fotografia apenas como um hobby!
Parabéns pelo blog.
Olá José,
durante pesquisa sobre o tema na internet encontrei este tuturial e gostei bastante da explicação sobre a relação entre profundidade de campo e distância focal, mas houve algo que me suscitou dúvidas e gostaria que o José me esclarecesse se possível.
Como referiu a profundidade de campo não varia consoante a distância focal, mas varia consoante a nossa distância ao assunto? Pois para conseguir o mesmo enquadramento nas duas imagens das frutas teve que se afastar quando utiliza a 600mm. Neste caso a profundidade de campo não deveria ser maior por estar mais afastado do assunto?
E quando refere que a proporção dos elementos se modifica em relação à distância focal usada, eu pensava que a proporção dos elementos não mudasse ao usar diferentes distâncias focais do mesmo local. O que iria provocar a mudança de proporções seria o afastamento ou aproximação ao assunto. Estou errada?
Obrigada.
Olá Manu,
Em relação à sua primeira dúvida a resposta é:
Não! A profundidade de campo representa a zona (ou plano) que podemos considerar nítido numa imagem. Se reparar nas fotos, na distância (antes e depois da tangerina focada) em que consegue descortinar de modo nítido o que lá vê é igual nas duas imagens. Ou seja, em ambos os casos só conseguimos ver nitidamente a tangerina. O que está aquém e além desta já não se apresenta nítido, certo?
Por isso, desde que a proporção do motivo fotografado (representado no sensor ou película) seja a mesma (independentemente da distância focal usada) a zona em que vêm as coisas nítidas (profundidade de campo) será a mesma.
A distância ao assunto varia mas, sendo representado com idêntica dimensão no fotograma, a zona de nitidez aceitável (antes e depois da zona onde se efectua a focagem) conseguida é a mesma.
Quanto à sua segunda dúvida, efectivamente, a proporção dos elementos muda em consonância com a distância focal utilizada. Repare no tamanho em que o limão está representado numa e noutra foto. Apesar da tangerina ser representada com o tal tamanho idêntico, o limão é bem maior na foto a 600mm, não? Assim como muda também o tamanho da tangerina (não focada) que se apresenta em primeiro plano.
Espero ter conseguido esclarecer…
Enviar um comentário